O calendário maia mais antigo fica no n.º 54 da povoação de Xultún.
Xultún fica na Guatemala, na América Central. É um local arqueológico da antiga civilização maia, que foi descoberto em 1905, mas passados mais de cem anos continua muito pouco estudado, e por isso pronto a revelar surpresas. Desde 2010 que uma equipa da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, está a estudar uma das casas do complexo, e encontrou pinturas da época clássica dos maias e o calendário mais antigo desta civilização, escrito nas paredes interiores da casa. A descoberta é publicada hoje na revista Science.
A casa está no meio de floresta tropical, e a envolvente que fica a poucos quilómetros da pirâmide de Tikal, no Norte da Guatemala, parece-se mais com uma habitação dos pequenos hobbits. Está um metro abaixo da superfície e nada tem que ver com as imponentes estruturas arquitectónicas desta civilização, que não sobreviveu à chegada dos europeus em 1492.
A povoação de Xultún estava habitada muito antes do derramamento de sangue que aconteceu com a vinda dos espanhóis. As pinturas desta casa, estudada por William Saturno e colegas, deverão ser do início do século IX d.C., mais precisamente do ano 813 ou 814, o que corresponde à época clássica dos maias, iniciada no ano 300 e que finda em 950.
Nesta altura, a povoação deveria ter dezenas de milhares de pessoas. A casa é mais uma de um complexo habitacional extenso. Tem o número 54, dado pelos investigadores da Universidade de Harvard que, na década de 1970, cartografaram parte do local. Numeraram apenas até à casa 56, há mais alguns milhares que ainda não têm número.
Mas o n.º 54 revelou mais do que o esperado. A estrutura já tinha sido saqueada, muito provavelmente por ladrões de túmulos. Por isso, parte do seu interior estava à mercê dos elementos da natureza e dos mosquitos. “Quando a vimos, pensámos: ‘Vamos entrar e ver o que resta e, se não houver nada, ao menos ficamos a saber o tamanho da divisão’”, disse William Saturno, da Universidade de Boston, numa entrevista num podcast da Science. Em 2010 e 2011, a equipa esteve primeiro a desenterrar a casa e depois a estudar as pinturas surpreendentes que encontrou.
Três paredes recheadas
A divisão tem 1,95 por 1,8 metros, e uma altura de três metros. O tecto é encurvado e, ao longo da divisão, há um banco de pedra que serviria de assento. “Pensamos que esta casa foi utilizada para a escrita. Está ligada a um complexo utilizado por escribas maias”, explica William Saturno.
A equipa chegou a estas conclusões depois de ver as pinturas. Quem entra na pequena casa encontra na parede à esquerda três figuras pretas sentadas, de tamanho natural, que olham para a parede mesmo à frente da porta de entrada. Nesta parede está um homem pintado de cor de laranja, com um estilete. Provavelmente, seria um escriba e tinha a mão esticada para outra figura mais imponente — devia ser o rei de Xultún —, o que mostra a relação entre quem vivia ali e a família real. As figura “estão envolvidas numa narrativa, em que o rei personifica uma divindade maia”, diz William Saturno.
Apesar de estes desenhos serem uma surpresa, não são uma novidade em relação ao que se conhece da época. O que é “fantástico”, nas palavras do arqueólogo, são os hieróglifos milimétricos escritos a preto e vermelho ao lado da pintura do rei e na parede à direita, que representam contagens de dias. Os famosos calendários maias já conhecidos, com os ciclos da Lua, de Marte e Vénus, como o códice de Dresden ¬— escrito em “papel” feito de casca de figueira —, são do período pós-clássico. O códice de Dresden é do século XI ou XII. Estas novas tabelas, do início do século IX, são assim mais antigas.
“Pela primeira vez, pudemos ver como eram os registos de um escriba”, disse Saturno. “Pareciam usar [as paredes] como um quadro de escola.” As tabelas, que não estão relacionadas com as pinturas, representam os calendários maias referentes aos ciclos de 260 dias das suas cerimónias, assim como os ciclos de 365 dias do Sol, 584 dias de Vénus e 780 dias de Marte destes astros no céu.
As tabelas têm colunas de números representados por pontos e travessões. O cientista refere que estes registos mais antigos não são tão correctos como os do códice de Dresden, que revela uma contagem aperfeiçoada dos dias até aos próximos eclipses lunares. Mas reflectem uma forma de olhar o mundo. “Os antigos maias previam que o mundo ia continuar e que daqui a 7000 anos as coisas iriam ser exactamente como agora”, diz William Saturno. “Continuamos sempre à procura de fins para as coisas. Mas os maias procuravam uma garantia de que nada iria mudar. Tinham uma forma de pensar completamente diferente.”
Fonte: Público
Xultún fica na Guatemala, na América Central. É um local arqueológico da antiga civilização maia, que foi descoberto em 1905, mas passados mais de cem anos continua muito pouco estudado, e por isso pronto a revelar surpresas. Desde 2010 que uma equipa da Universidade de Boston, nos Estados Unidos, está a estudar uma das casas do complexo, e encontrou pinturas da época clássica dos maias e o calendário mais antigo desta civilização, escrito nas paredes interiores da casa. A descoberta é publicada hoje na revista Science.
A casa está no meio de floresta tropical, e a envolvente que fica a poucos quilómetros da pirâmide de Tikal, no Norte da Guatemala, parece-se mais com uma habitação dos pequenos hobbits. Está um metro abaixo da superfície e nada tem que ver com as imponentes estruturas arquitectónicas desta civilização, que não sobreviveu à chegada dos europeus em 1492.
A povoação de Xultún estava habitada muito antes do derramamento de sangue que aconteceu com a vinda dos espanhóis. As pinturas desta casa, estudada por William Saturno e colegas, deverão ser do início do século IX d.C., mais precisamente do ano 813 ou 814, o que corresponde à época clássica dos maias, iniciada no ano 300 e que finda em 950.
Nesta altura, a povoação deveria ter dezenas de milhares de pessoas. A casa é mais uma de um complexo habitacional extenso. Tem o número 54, dado pelos investigadores da Universidade de Harvard que, na década de 1970, cartografaram parte do local. Numeraram apenas até à casa 56, há mais alguns milhares que ainda não têm número.
Mas o n.º 54 revelou mais do que o esperado. A estrutura já tinha sido saqueada, muito provavelmente por ladrões de túmulos. Por isso, parte do seu interior estava à mercê dos elementos da natureza e dos mosquitos. “Quando a vimos, pensámos: ‘Vamos entrar e ver o que resta e, se não houver nada, ao menos ficamos a saber o tamanho da divisão’”, disse William Saturno, da Universidade de Boston, numa entrevista num podcast da Science. Em 2010 e 2011, a equipa esteve primeiro a desenterrar a casa e depois a estudar as pinturas surpreendentes que encontrou.
Três paredes recheadas
A divisão tem 1,95 por 1,8 metros, e uma altura de três metros. O tecto é encurvado e, ao longo da divisão, há um banco de pedra que serviria de assento. “Pensamos que esta casa foi utilizada para a escrita. Está ligada a um complexo utilizado por escribas maias”, explica William Saturno.
A equipa chegou a estas conclusões depois de ver as pinturas. Quem entra na pequena casa encontra na parede à esquerda três figuras pretas sentadas, de tamanho natural, que olham para a parede mesmo à frente da porta de entrada. Nesta parede está um homem pintado de cor de laranja, com um estilete. Provavelmente, seria um escriba e tinha a mão esticada para outra figura mais imponente — devia ser o rei de Xultún —, o que mostra a relação entre quem vivia ali e a família real. As figura “estão envolvidas numa narrativa, em que o rei personifica uma divindade maia”, diz William Saturno.
Apesar de estes desenhos serem uma surpresa, não são uma novidade em relação ao que se conhece da época. O que é “fantástico”, nas palavras do arqueólogo, são os hieróglifos milimétricos escritos a preto e vermelho ao lado da pintura do rei e na parede à direita, que representam contagens de dias. Os famosos calendários maias já conhecidos, com os ciclos da Lua, de Marte e Vénus, como o códice de Dresden ¬— escrito em “papel” feito de casca de figueira —, são do período pós-clássico. O códice de Dresden é do século XI ou XII. Estas novas tabelas, do início do século IX, são assim mais antigas.
“Pela primeira vez, pudemos ver como eram os registos de um escriba”, disse Saturno. “Pareciam usar [as paredes] como um quadro de escola.” As tabelas, que não estão relacionadas com as pinturas, representam os calendários maias referentes aos ciclos de 260 dias das suas cerimónias, assim como os ciclos de 365 dias do Sol, 584 dias de Vénus e 780 dias de Marte destes astros no céu.
As tabelas têm colunas de números representados por pontos e travessões. O cientista refere que estes registos mais antigos não são tão correctos como os do códice de Dresden, que revela uma contagem aperfeiçoada dos dias até aos próximos eclipses lunares. Mas reflectem uma forma de olhar o mundo. “Os antigos maias previam que o mundo ia continuar e que daqui a 7000 anos as coisas iriam ser exactamente como agora”, diz William Saturno. “Continuamos sempre à procura de fins para as coisas. Mas os maias procuravam uma garantia de que nada iria mudar. Tinham uma forma de pensar completamente diferente.”
Fonte: Público
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