As teorias tradicionais sobre as emoções dizem que é possível ler, na cara, se uma experiência extrema que se está a viver é positiva ou negativa. Um novo estudo, na revista Science, conclui que não é bem assim.
Será que a derrota ou a vitória ficam estampadas na cara de uma forma diferente? Parece que não, quando vivemos momentos de emoções extremas. Afinal, é o corpo que mais revela os sentimentos em situações extraordinárias, como quando se ganha a lotaria ou se vê um filho a ser atropelado, conclui um estudo publicado na última edição da revista Science.
Os modelos tradicionais das emoções defendem que a raiva ou a felicidade provocam expressões faciais distintas, isto porque os músculos que são activados são diferentes. Estas diferenças, dizem os modelos, são úteis para os outros interpretarem o estado emocional, se é positivo ou negativo, de quem passa por essas situações.
No entanto, há poucos trabalhos que avaliam as expressões faciais durante estas experiências emocionais extremas. Estes estados são intensos e duram pouco tempo, como quando se obtém o ponto decisivo que permite ganhar uma partida de ténis, ou quando se perfura um mamilo com um piercing.
A equipa de Hillel Aviezer, da Universidade de Princeton, em New Jersey, nos Estados Unidos, foi avaliar se "as expressões faciais de significado afectivo oposto podem sobrepor-se durante picos muito intensos de emoção" - ou seja, se nestas situações extremas a cara que fazemos é, de facto, diferente consoante vivemos um acontecimento positivo ou negativo. Ou se, afinal, até temos uma expressão semelhante, independentemente do valor da experiência. Esta questão não é descabida: os trabalhos em neurociências mostram que emoções opostas activam as mesmas regiões do cérebro.
Para avaliar isso, a equipa fez uma experiência com imagens de jogadores de ténis no momento de emoção mais extrema, logo após perderem ou ganharem um ponto durante uma partida. As imagens mostram tanto a expressão facial como corporal do desportista.
Os cientistas isolaram, depois, as caras dos corpos dos tenistas e deram a observar três tipos de imagens distintas a três grupos de participantes de 15 pessoas cada. Algumas imagens eram integrais com o corpo e a cara dos jogadores, outras só tinham a cara sem o corpo e o terceiro grupo mostrava o corpo sem a cara.
Os cientistas pediram aos participantes para observar as imagens e avaliar as emoções dos jogadores. "Quando só viam as caras, os participantes falhavam na avaliação das emoções positivas, embora não no caso dos derrotados. Mas tinham sucesso quando viam só o corpo ou o corpo e a cara em conjunto", diz o artigo. Os resultados foram claros: a expressão facial é muito ambígua nos casos emocionais extremos.
O efeito de ilusão facial
Para confirmar estes dados, os cientistas usaram a técnica de corte e colagem: recortaram a face do jogador durante uma vitória e colocaram-na no mesmo jogador quando sofreu uma derrota. A imagem resultante mostrava o jogador com uma cara de felicidade num corpo de sofrimento. Fizeram também o inverso: um recorte de um jogador com a cara infeliz num corpo vitorioso.
Os participantes viram estas imagens reconstruídas: mesmo sem terem consciência disso, o corpo é que foi determinante para a avaliação que fizeram do estado emocional dos jogadores. O corpo de um jogador derrotado era sempre avaliado com um valor negativo, quer a cara fosse a do tenista derrotado ou a do mesmo tenista vitorioso. O contrário também se passava: os participantes consideravam estar perante um estado emocional positivo, se o corpo fosse de um jogador que acabava de ganhar um ponto, mesmo que a cara mostrasse uma reacção de derrota.
Perguntou-se depois a um grupo de pessoas que não participaram nesta experiência, mas que viram as imagens, se o mais importante para a avaliação do estado emocional era a cara, o corpo ou ambos. "Oitenta por cento escolheu a face como a região do corpo mais determinante para se diagnosticar o significado [emocional], 20% a cara e o corpo, e nenhum dos participantes escolheu o corpo", lê-se no artigo.
Como é que os autores do artigo interpretaram este conjunto de respostas? "Referimo-nos a este fenómeno como o efeito de ilusão facial." Mesmo que a expressão da cara seja ambígua, as pessoas assumem que é distintiva para a boa interpretação das emoções. Para a equipa, isto confirma a existência de uma lacuna entre as expressões faciais que as pessoas estão à espera de ver e as expressões que realmente ocorrem.
"Quando as emoções se tornam intensas, a diferença entre as expressões faciais positivas e negativas esboroa-se", diz Hillel Aviezer em comunicado. "Esta descoberta põe em causa os modelos básicos de comportamento nas Neurociências, na Psicologia Social e na Economia."
Mas se estamos habituados a interpretar um sorriso como sinal de alegria e as sobrancelhas descaídas como tristeza, então como se explica que em situações extremas - de dor, raiva ou felicidade - a expressão da cara seja indistinta? "A nível muscular, esta incapacidade de produzir uma expressão que leve ao diagnóstico pode reflectir uma musculatura facial que não está preparada para transmitir uma emoção de intensidade extrema", explicam os cientistas no artigo.
Talvez, remata a equipa, a avaliação da cara não seja assim tão importante. Na grande maioria dos casos, o contexto da situação será clarificador do estado emocional das pessoas. Seja como for, uma expressão emocional extrema passa depois para um estado menos ambíguo de alegria ou de tristeza, que já permite uma leitura mais fácil das emoções dos outros.
Fonte: Público
Será que a derrota ou a vitória ficam estampadas na cara de uma forma diferente? Parece que não, quando vivemos momentos de emoções extremas. Afinal, é o corpo que mais revela os sentimentos em situações extraordinárias, como quando se ganha a lotaria ou se vê um filho a ser atropelado, conclui um estudo publicado na última edição da revista Science.
Os modelos tradicionais das emoções defendem que a raiva ou a felicidade provocam expressões faciais distintas, isto porque os músculos que são activados são diferentes. Estas diferenças, dizem os modelos, são úteis para os outros interpretarem o estado emocional, se é positivo ou negativo, de quem passa por essas situações.
No entanto, há poucos trabalhos que avaliam as expressões faciais durante estas experiências emocionais extremas. Estes estados são intensos e duram pouco tempo, como quando se obtém o ponto decisivo que permite ganhar uma partida de ténis, ou quando se perfura um mamilo com um piercing.
A equipa de Hillel Aviezer, da Universidade de Princeton, em New Jersey, nos Estados Unidos, foi avaliar se "as expressões faciais de significado afectivo oposto podem sobrepor-se durante picos muito intensos de emoção" - ou seja, se nestas situações extremas a cara que fazemos é, de facto, diferente consoante vivemos um acontecimento positivo ou negativo. Ou se, afinal, até temos uma expressão semelhante, independentemente do valor da experiência. Esta questão não é descabida: os trabalhos em neurociências mostram que emoções opostas activam as mesmas regiões do cérebro.
Para avaliar isso, a equipa fez uma experiência com imagens de jogadores de ténis no momento de emoção mais extrema, logo após perderem ou ganharem um ponto durante uma partida. As imagens mostram tanto a expressão facial como corporal do desportista.
Os cientistas isolaram, depois, as caras dos corpos dos tenistas e deram a observar três tipos de imagens distintas a três grupos de participantes de 15 pessoas cada. Algumas imagens eram integrais com o corpo e a cara dos jogadores, outras só tinham a cara sem o corpo e o terceiro grupo mostrava o corpo sem a cara.
Os cientistas pediram aos participantes para observar as imagens e avaliar as emoções dos jogadores. "Quando só viam as caras, os participantes falhavam na avaliação das emoções positivas, embora não no caso dos derrotados. Mas tinham sucesso quando viam só o corpo ou o corpo e a cara em conjunto", diz o artigo. Os resultados foram claros: a expressão facial é muito ambígua nos casos emocionais extremos.
O efeito de ilusão facial
Para confirmar estes dados, os cientistas usaram a técnica de corte e colagem: recortaram a face do jogador durante uma vitória e colocaram-na no mesmo jogador quando sofreu uma derrota. A imagem resultante mostrava o jogador com uma cara de felicidade num corpo de sofrimento. Fizeram também o inverso: um recorte de um jogador com a cara infeliz num corpo vitorioso.
Os participantes viram estas imagens reconstruídas: mesmo sem terem consciência disso, o corpo é que foi determinante para a avaliação que fizeram do estado emocional dos jogadores. O corpo de um jogador derrotado era sempre avaliado com um valor negativo, quer a cara fosse a do tenista derrotado ou a do mesmo tenista vitorioso. O contrário também se passava: os participantes consideravam estar perante um estado emocional positivo, se o corpo fosse de um jogador que acabava de ganhar um ponto, mesmo que a cara mostrasse uma reacção de derrota.
Perguntou-se depois a um grupo de pessoas que não participaram nesta experiência, mas que viram as imagens, se o mais importante para a avaliação do estado emocional era a cara, o corpo ou ambos. "Oitenta por cento escolheu a face como a região do corpo mais determinante para se diagnosticar o significado [emocional], 20% a cara e o corpo, e nenhum dos participantes escolheu o corpo", lê-se no artigo.
Como é que os autores do artigo interpretaram este conjunto de respostas? "Referimo-nos a este fenómeno como o efeito de ilusão facial." Mesmo que a expressão da cara seja ambígua, as pessoas assumem que é distintiva para a boa interpretação das emoções. Para a equipa, isto confirma a existência de uma lacuna entre as expressões faciais que as pessoas estão à espera de ver e as expressões que realmente ocorrem.
"Quando as emoções se tornam intensas, a diferença entre as expressões faciais positivas e negativas esboroa-se", diz Hillel Aviezer em comunicado. "Esta descoberta põe em causa os modelos básicos de comportamento nas Neurociências, na Psicologia Social e na Economia."
Mas se estamos habituados a interpretar um sorriso como sinal de alegria e as sobrancelhas descaídas como tristeza, então como se explica que em situações extremas - de dor, raiva ou felicidade - a expressão da cara seja indistinta? "A nível muscular, esta incapacidade de produzir uma expressão que leve ao diagnóstico pode reflectir uma musculatura facial que não está preparada para transmitir uma emoção de intensidade extrema", explicam os cientistas no artigo.
Talvez, remata a equipa, a avaliação da cara não seja assim tão importante. Na grande maioria dos casos, o contexto da situação será clarificador do estado emocional das pessoas. Seja como for, uma expressão emocional extrema passa depois para um estado menos ambíguo de alegria ou de tristeza, que já permite uma leitura mais fácil das emoções dos outros.
Fonte: Público
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