O cérebro humano é o objecto mais complexo que conhecemos, mas a organização das suas ligações nervosas é das coisas mais simples que se possa imaginar.
Basta olhar para a imagem que ilustra esta notícia para perceber do que se trata. Elas revelam que, ao contrário do que se poderia pensar, a arquitectura das ligações nervosas no cérebro não tem nada a ver com um emaranhado sem nexo de esparguete — e tudo a ver com a malha, muito bem organizada e estruturada, de um tecido acabado de sair do tear. Esta sexta-feira, na revista Science, Van Wedeen, da Universidade de Harvard, e colegas publicam estas espectaculares visualizações do cérebro (humano e de vários primatas) e explicam como chegaram à surpreendente conclusão de que a arquitectura dos circuitos nervosos, que define a geometria subjacente do cérebro adulto, é uma simples retícula 3D, com todas as fibras projectadas pelos neurónios a entrecruzarem-se em ângulo recto numa das três dimensões do espaço.
“O nosso objectivo era mapear a arquitectura das fibras cerebrais”, explica Wedeen num podcast no site da revista. “Dada uma ligação, por onde é que ela passa na sua vizinhança imediata? Descobrimos que essa organização não podia ser mais simples.” As fibras formam superfícies curvas onde pacotes de fibras paralelas entre si se cruzam num ângulo recto com outros pacotes de fibras paralelas entre si. E não é tudo: o fenómeno não é apenas local, estende-se ao cérebro todo. Essas superfícies bidimensionais não são independentes umas das outras: empilham-se umas em cima das outras e estão ligadas entre si por pacotes de fibras perpendiculares a elas, fazendo com que a totalidade do cérebro esteja interligada da mesma forma: “As diversas partes do cérebro são como as peças de um puzzle que se encaixam umas nas outras”, salienta Weeden. “A estrutura do cérebro é um todo unificado.” Não é aleatória, mas construída com base em regras extremamente simples. “No cérebro adulto”, explica ainda Wedeen, “as fibras estão tremendamente retorcidas e dobradas, mas a geometria do cérebro continua a poder ser essencialmente descrita como uma retícula 3D”.
Já se sabia que as ligações nervosas dentro de certas partes do cérebro, como a espinal medula ou o tronco cerebral (uma das suas estruturas mais “primitivas”), estavam assim organizadas — espelhando, aliás, os padrões de base do desenvolvimento embrionário. Mas o resto do cérebro — e em particular o córtex, a sua casca exterior, responsável pelas funções cognitivas superiores dos humanos — tem um aspecto tão retorcido, com tantas convoluções, que parecia impossível que essa mesma organização ali prevalecesse, já para não falar nas interligações à escala global. Mas estava fora de questão fazer-se estudos no ser humano injectando, por exemplo, compostos químicos para seguir o seu rasto nos tecidos cerebrais.
Agora, os investigadores conseguiram ultrapassar os obstáculos graças às mais poderosas técnicas de visualização não invasiva do cérebro, aliadas a sofisticadas análises matemáticas. E o sistema subjacente, que rege o desenvolvimento do cérebro guiando o crescimento das fibras nervosas e que até aqui permanecera oculto, surgiu então com toda a sua elegante simplicidade.
A técnica de visualização utilizada foi a DSI (diffusion spectrum imaging), forma de ressonância magnética que “mapeia as fibras [nervosas] através dos movimentos das moléculas de água nos tecidos”, diz Wedeen. “A seguir, uma série de análises matemáticas permitiram inferir qual o padrão de fibras nervosas mais susceptível de ter produzido esse padrão de fluxos de água.”
Os cientistas analisaram a forma como as fibras nervosas se cruzam em diversos pontos do cérebro, para “desmontar a estrutura dos cruzamentos”. E viram que “em cada cantinho, essa estrutura é basicamente uma grelha cúbica”. E também analisaram os cérebros de vários primatas e de voluntários humanos, pondo em evidência o mesmo tipo de sistema natural de “coordenadas espaciais” em todos essas espécies.
“Acho que ninguém suspeitava que o cérebro pudesse ter este tipo de padrão geométrico omnipresente”, frisa Wedeen. Para mais, esta forma de construção do cérebro faz todo o sentido do ponto de vista evolutivo, tornando possível a crescente complexidade do cérebro: “É precisamente a simplicidade desta estrutura quadricular que permite integrar as mudanças graduais e aleatórias da evolução”, diz o investigador.
Fonte: Público
Basta olhar para a imagem que ilustra esta notícia para perceber do que se trata. Elas revelam que, ao contrário do que se poderia pensar, a arquitectura das ligações nervosas no cérebro não tem nada a ver com um emaranhado sem nexo de esparguete — e tudo a ver com a malha, muito bem organizada e estruturada, de um tecido acabado de sair do tear. Esta sexta-feira, na revista Science, Van Wedeen, da Universidade de Harvard, e colegas publicam estas espectaculares visualizações do cérebro (humano e de vários primatas) e explicam como chegaram à surpreendente conclusão de que a arquitectura dos circuitos nervosos, que define a geometria subjacente do cérebro adulto, é uma simples retícula 3D, com todas as fibras projectadas pelos neurónios a entrecruzarem-se em ângulo recto numa das três dimensões do espaço.
“O nosso objectivo era mapear a arquitectura das fibras cerebrais”, explica Wedeen num podcast no site da revista. “Dada uma ligação, por onde é que ela passa na sua vizinhança imediata? Descobrimos que essa organização não podia ser mais simples.” As fibras formam superfícies curvas onde pacotes de fibras paralelas entre si se cruzam num ângulo recto com outros pacotes de fibras paralelas entre si. E não é tudo: o fenómeno não é apenas local, estende-se ao cérebro todo. Essas superfícies bidimensionais não são independentes umas das outras: empilham-se umas em cima das outras e estão ligadas entre si por pacotes de fibras perpendiculares a elas, fazendo com que a totalidade do cérebro esteja interligada da mesma forma: “As diversas partes do cérebro são como as peças de um puzzle que se encaixam umas nas outras”, salienta Weeden. “A estrutura do cérebro é um todo unificado.” Não é aleatória, mas construída com base em regras extremamente simples. “No cérebro adulto”, explica ainda Wedeen, “as fibras estão tremendamente retorcidas e dobradas, mas a geometria do cérebro continua a poder ser essencialmente descrita como uma retícula 3D”.
Já se sabia que as ligações nervosas dentro de certas partes do cérebro, como a espinal medula ou o tronco cerebral (uma das suas estruturas mais “primitivas”), estavam assim organizadas — espelhando, aliás, os padrões de base do desenvolvimento embrionário. Mas o resto do cérebro — e em particular o córtex, a sua casca exterior, responsável pelas funções cognitivas superiores dos humanos — tem um aspecto tão retorcido, com tantas convoluções, que parecia impossível que essa mesma organização ali prevalecesse, já para não falar nas interligações à escala global. Mas estava fora de questão fazer-se estudos no ser humano injectando, por exemplo, compostos químicos para seguir o seu rasto nos tecidos cerebrais.
Agora, os investigadores conseguiram ultrapassar os obstáculos graças às mais poderosas técnicas de visualização não invasiva do cérebro, aliadas a sofisticadas análises matemáticas. E o sistema subjacente, que rege o desenvolvimento do cérebro guiando o crescimento das fibras nervosas e que até aqui permanecera oculto, surgiu então com toda a sua elegante simplicidade.
A técnica de visualização utilizada foi a DSI (diffusion spectrum imaging), forma de ressonância magnética que “mapeia as fibras [nervosas] através dos movimentos das moléculas de água nos tecidos”, diz Wedeen. “A seguir, uma série de análises matemáticas permitiram inferir qual o padrão de fibras nervosas mais susceptível de ter produzido esse padrão de fluxos de água.”
Os cientistas analisaram a forma como as fibras nervosas se cruzam em diversos pontos do cérebro, para “desmontar a estrutura dos cruzamentos”. E viram que “em cada cantinho, essa estrutura é basicamente uma grelha cúbica”. E também analisaram os cérebros de vários primatas e de voluntários humanos, pondo em evidência o mesmo tipo de sistema natural de “coordenadas espaciais” em todos essas espécies.
“Acho que ninguém suspeitava que o cérebro pudesse ter este tipo de padrão geométrico omnipresente”, frisa Wedeen. Para mais, esta forma de construção do cérebro faz todo o sentido do ponto de vista evolutivo, tornando possível a crescente complexidade do cérebro: “É precisamente a simplicidade desta estrutura quadricular que permite integrar as mudanças graduais e aleatórias da evolução”, diz o investigador.
Fonte: Público
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