sexta-feira, 13 de abril de 2012

China promete curas com células estaminais apesar do cerco das autoridades

A China tornou-se num imenso mercado para as empresas que prometem curas com células estaminais para doenças como Alzheimer, Parkinson, diabetes, esclerose múltipla ou autismo. Apesar da inexistência de provas sobre a eficácia destas terapias, milhares de pessoas arriscam a sua sorte. Pequim está a tentar pôr cobro a esta farsa, mas até agora sem sucesso.
Três meses depois de o Ministério da Saúde chinês ter aumentado os seus esforços para erradicar o uso clínico de tratamentos não eficazes com células estaminais, uma investigação da revista “Nature” revela que múltiplas empresas e clínicas em vários pontos do país continuam a ficar com o dinheiro de doentes em troca de terapias cuja eficácia ainda está por provar.
Estas clínicas publicitam casos de doentes que dizem ter experimentado benefícios dos tratamentos e alguns destes centros até têm instalações associadas a complexos hospitalares, dando-lhes uma aparência de legitimidade que, de acordo com a Nature, é falsa. “Peritos em células estaminais contactados pela revista insistem que este estas terapias não estão em fase de poder ser usadas clinicamente e que algumas terapias poderão até pôr em risco a saúde dos doentes”, escreve a revista, sublinhando, porém, que o Governo chinês está a lutar contra este tipo de práticas.
As células estaminais têm a capacidade de originar vários tipos de células do organismo, o que as torna promissoras na regeneração de tecidos, nomeadamente em doenças neurodegenerativas. Mas até esses tratamentos serem uma realidade, ainda há muita investigação científica de base pela frente.
A partir de Janeiro deste ano, reconhecendo que esta situação estava a perder o controlo - apesar de, em 2009, já ter classificado estes tratamentos de “alto risco” -, Pequim anunciou um pacote de medidas para este tipo de actividade, obrigando as empresas e clínicas a registarem-se junto das autoridades para poderem levar a cabo as suas práticas. Paralelamente, o Ministério da Saúde pediu às autoridades sanitárias locais que pusessem cobro, nas respectivas regiões, a qualquer actividade não aprovada envolvendo células estaminais. O Governo lançou ainda uma moratória para novos ensaios clínicos e argumentou que os doentes já envolvidos em terapias não deveriam pagar esses tratamentos.
Até agora, porém, toda esta repressão por parte das autoridades tem-se revelado ineficaz, revela a Nature.
De acordo com um porta-voz do Ministério da Saúde, nem uma clínica se registou junto das autoridades da forma correcta e a Nature descobriu que muitas continuam no mercado, a oferecer este tipo de tratamentos.
A WA Optimum Health Care é uma destas clínicas. Está instalada numa das zonas mais prósperas de Xangai e oferece um tratamento entre quatro e oito injecções de células estaminais (o preço de cada injecção varia entre os 3600 e os 6000 euros) para tratar a doença de Alzheimer. A terapia contra o autismo pode ser ainda mais cara, revela David Cyranski, autor da investigação.
Outra clínica (Tong Yuan Stem Cell) assegura ter já tratado mais de 10 mil doentes que padeciam de diversas enfermidades e indica que a sua terapia para o autismo, por exemplo, dura um ano e tem por base quatro injecções de células estaminais de fetos abortados.
“Essas clínicas afirmam ter êxito, mas até agora nenhuma publicou dados com grupos de controlo”, frisou Cyranski.
O problema é tão grave que a Nature dedica um editorial ao assunto, chegando a comparar esta situação à prática da lobotomia, há quase um século.
Diversos peritos internacionais frisam que estes tratamentos poderão provocar doenças auto-imunes e até alguns tipos de cancros.
Precisamente porque as doenças que este tipo de tratamentos prometem resolver são muito graves, estas empresas e clínicas - que se anunciam livremente online - atraem milhares de pessoas de todo o mundo. Algumas delas até afirmam ter parcerias com centros de investigação norte-americanos, como a Universidade de Harvard ou a Universidade da Califórnia, que negam rotundamente semelhantes relações.

Fonte: Público

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