O Sudeste asiático tem sido o melhor berço para o aparecimento de parasitas resistentes aos medicamentos contra a malária. Quando foram relatados casos de resistência à artemisinina no Camboja, em 2008, as organizações internacionais de saúde esforçaram-se para matar o parasita no país. Agora, uma investigação revela os primeiros sinais do mesmo fenómeno na Tailândia. O trabalho desta equipa — que resultou em dois artigos diferentes publicados nesta quinta-feira, um na revista The Lancet e outro na Science — associou a resistência a regiões do ADN do parasita.
A artemisinina é a última bóia de salvação contra a malária, que, em 2010, matou 655 mil pessoas. A doença é causada por várias espécies do Plasmodium, sendo o Plasmodium falciparum a mais violenta. O parasita é injectado no sangue pelo mosquito anófeles, reproduz-se primeiro no fígado e depois passa para o sangue, onde infecta os glóbulos vermelhos e se multiplica, causando febres altas, dores de cabeça e mal-estar.
O Sudeste asiático, a África Subsariana e América do Sul são as regiões mais atingidas pela malária. A mortalidade recai nas crianças até aos cinco anos, mas a doença ataca toda a população e é um dos responsáveis pela improdutividade em África, em conjunto com a sida e a tuberculose. Devido à complexidade do parasita, tem sido difícil produzirem-se novos medicamentos e não há uma vacina eficaz. A artemisinina, identificada na China na década de 1960, é administrada com outros fármacos e tem evitado muitas mortes até agora.
Liderada por François Nosten, da Unidade de Investigação da Malária de Shoklo, na Tailândia, e Timothy Anderson, do Instituto de Investigação Biomédica do Texas (EUA), a equipa analisou 3202 pacientes no Noroeste da Tailândia com malária, entre 2001 e 2010, que foram tratados com um derivado da artemisinina. Nestes anos, o tempo médio de vida dos parasitas no sangue aumentou de 2,6 para 3,7 horas. No foco do Camboja, o primeiro, a 800 quilómetros da região agora analisada, este período é de 5,5 horas. Os dados, consideram os especialistas, obrigam a que o esforço de luta contra a doença no Camboja se intensifique.
“A resistência à artemisinina apareceu na fronteira da Tailândia com a Birmânia há pelo menos oito anos e, desde aí, tem aumentado substancialmente. A este ritmo, em dois a seis anos vai alcançar os níveis do Oeste do Camboja”, conclui o artigo na The Lancet.
Esta resistência não é total, por enquanto só atrasa a letalidade do fármaco. Mas os cientistas temem que se repita o que aconteceu com a cloroquina e o fansidar, dois antimaláricos a que os parasitas ganharam resistência na Ásia e que se alastraram para África. Embora a resistência à artemisinina tenha sido detectada numa fase inicial, um cenário semelhante no futuro “seria uma tragédia sanitária que resultaria em milhões de mortos”, resume Standwell Nkhoma, da equipa do Texas.
Por que é que as mutações que dão ao parasita resistência contra os antimaláricos aparecem no Sudeste asiático? “Pensa-se que os parasitas desta região possam ter uma constituição genética que lhes confere uma maior predisposição para adquirir resistência”, responde Pedro Cravo ao PÚBLICO. O português, do Instituto de Higiene e Medicina Tropical de Lisboa, está agora a trabalhar no Brasil, na resistência da malária à artemisinina. Não se sabe se a população de parasitas da Tailândia emergiu independentemente da do Camboja. Mas a equipa conseguiu agora associar as resistências a várias regiões do genoma do parasita, em especial a dez genes no cromossoma 13. De seguida, a equipa quer perceber melhor como surgem estas mutações, para evitar o aparecimento de novos focos de resistência.
Parasita entra em dormência
A forma como o Plasmodium adquire resistência à artemisinina ainda é desconhecida, mas pensa-se que os parasitas (na imagem ao lado, dentro de glóbulos vermelhos) podem alterar o seu metabolismo.
“Uma das hipóteses é que os parasitas resistentes entram numa fase dormente durante o tratamento da artemisinina, param de crescer e esperam que o fármaco seja degradado pelo organismo, antes de continuarem a infecção”, diz num podcast da Science Ian Cheeseman, um dos autores do artigo na mesma revista. Um dos dez genes do cromossoma 13, agora associados à resistência, é de uma família activada em caso de stress térmico ou químico e pode ter um papel neste processo.
Fonte: Público
A artemisinina é a última bóia de salvação contra a malária, que, em 2010, matou 655 mil pessoas. A doença é causada por várias espécies do Plasmodium, sendo o Plasmodium falciparum a mais violenta. O parasita é injectado no sangue pelo mosquito anófeles, reproduz-se primeiro no fígado e depois passa para o sangue, onde infecta os glóbulos vermelhos e se multiplica, causando febres altas, dores de cabeça e mal-estar.
O Sudeste asiático, a África Subsariana e América do Sul são as regiões mais atingidas pela malária. A mortalidade recai nas crianças até aos cinco anos, mas a doença ataca toda a população e é um dos responsáveis pela improdutividade em África, em conjunto com a sida e a tuberculose. Devido à complexidade do parasita, tem sido difícil produzirem-se novos medicamentos e não há uma vacina eficaz. A artemisinina, identificada na China na década de 1960, é administrada com outros fármacos e tem evitado muitas mortes até agora.
Liderada por François Nosten, da Unidade de Investigação da Malária de Shoklo, na Tailândia, e Timothy Anderson, do Instituto de Investigação Biomédica do Texas (EUA), a equipa analisou 3202 pacientes no Noroeste da Tailândia com malária, entre 2001 e 2010, que foram tratados com um derivado da artemisinina. Nestes anos, o tempo médio de vida dos parasitas no sangue aumentou de 2,6 para 3,7 horas. No foco do Camboja, o primeiro, a 800 quilómetros da região agora analisada, este período é de 5,5 horas. Os dados, consideram os especialistas, obrigam a que o esforço de luta contra a doença no Camboja se intensifique.
“A resistência à artemisinina apareceu na fronteira da Tailândia com a Birmânia há pelo menos oito anos e, desde aí, tem aumentado substancialmente. A este ritmo, em dois a seis anos vai alcançar os níveis do Oeste do Camboja”, conclui o artigo na The Lancet.
Esta resistência não é total, por enquanto só atrasa a letalidade do fármaco. Mas os cientistas temem que se repita o que aconteceu com a cloroquina e o fansidar, dois antimaláricos a que os parasitas ganharam resistência na Ásia e que se alastraram para África. Embora a resistência à artemisinina tenha sido detectada numa fase inicial, um cenário semelhante no futuro “seria uma tragédia sanitária que resultaria em milhões de mortos”, resume Standwell Nkhoma, da equipa do Texas.
Por que é que as mutações que dão ao parasita resistência contra os antimaláricos aparecem no Sudeste asiático? “Pensa-se que os parasitas desta região possam ter uma constituição genética que lhes confere uma maior predisposição para adquirir resistência”, responde Pedro Cravo ao PÚBLICO. O português, do Instituto de Higiene e Medicina Tropical de Lisboa, está agora a trabalhar no Brasil, na resistência da malária à artemisinina. Não se sabe se a população de parasitas da Tailândia emergiu independentemente da do Camboja. Mas a equipa conseguiu agora associar as resistências a várias regiões do genoma do parasita, em especial a dez genes no cromossoma 13. De seguida, a equipa quer perceber melhor como surgem estas mutações, para evitar o aparecimento de novos focos de resistência.
Parasita entra em dormência
A forma como o Plasmodium adquire resistência à artemisinina ainda é desconhecida, mas pensa-se que os parasitas (na imagem ao lado, dentro de glóbulos vermelhos) podem alterar o seu metabolismo.
“Uma das hipóteses é que os parasitas resistentes entram numa fase dormente durante o tratamento da artemisinina, param de crescer e esperam que o fármaco seja degradado pelo organismo, antes de continuarem a infecção”, diz num podcast da Science Ian Cheeseman, um dos autores do artigo na mesma revista. Um dos dez genes do cromossoma 13, agora associados à resistência, é de uma família activada em caso de stress térmico ou químico e pode ter um papel neste processo.
Fonte: Público
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