Afinal, onde é que está a Voyager 1? No site da NASA os números correm em tempo real, e dizem-nos que a sonda lançada há 35 anos está a 18,2 mil milhões de quilómetros de distância da Terra, ou seja, o equivalente a 121,9 vezes a distância que existe entre o nosso planeta e o Sol. A Voyager 1 está muito para lá da órbita de Plutão ou de qualquer outro instrumento enviado para o espaço. Mas, de acordo com um trabalho publicado recentemente na Nature, não se sabe qual a sua posição em relação ao limite do Sistema Solar e a sonda pode ainda levar algum tempo a passar esta última fronteira e entrar finalmente no espaço interestelar.
O Sistema Solar tem o formato de um cometa com uma cauda, que viaja pelo espaço, orbitando em torno do centro da Alfa do Centauro. O Sol está situado no centro da cabeça deste "cometa" e gira lentamente à volta do núcleo da nossa galáxia. Um dos efeitos da sua actividade é a emissão constante de um fluxo de protões e electrões que são expulsos do Sol com muita energia e velocidade, originando o vento solar.
Mas estas partículas vão desacelerando. Em teoria, existe uma fronteira em que as partículas já não empurram o meio intergaláctico, que tem uma constituição de partículas diferente. Mas até onde existe, o vento solar produz no espaço uma atmosfera própria chamada heliosfera que determina as fronteiras do Sistema Solar. À frente do Sol e devido ao movimento da estrela, a espessura da heliosfera é mais pequena. É no limite desta região que a Voyager 1, a sonda da agência espacial norte-americana (NASA), viaja.
Esperava-se, no ano passado, que a máquina ultrapassasse a fronteira do Sistema Solar, depois de as suas medições mostrarem que as velocidades das partículas caíram para zero. Esta observação ia ao encontro do que os cientistas defendiam: a dado momento, depois de viajarem no espaço, as partículas solares deixariam de ter força para empurrar o espaço interestelar e, em vez disso, iniciariam um movimento lateral, tal como acontece quando um fluxo de água embate numa superfície sólida. Desta forma, haveria uma região entre o espaço interestelar e a heliosfera chamado heliopausa.
Mas Robert Decker e Stamatios Krimigis, dois dos autores do artigo da Nature, não mediram esta corrente lateral de partículas. "Concluímos que a Voyager 1 não está neste momento perto da heliopausa, pelo menos na forma como [esta região] foi imaginada", lê-se no artigo da equipa do laboratório de física aplicada da Universidade de Johns Hopkins. O que, em boa medida, significa que, mais de três décadas depois de ter saído da Terra, a sonda continua a surpreender-nos com as suas descobertas.
A Voyager 1 está hoje numa missão interestelar, mas nem sempre foi assim. O objectivo inicial desta sonda e da Voyager 2 - a outra sonda da missão que também continua viva e também se dirige para os confins do Sistema Solar, apesar de não estar tão afastada da Terra -, era o estudo de Júpiter, Saturno e as luas que giram em torno destes planetas.
A Voyager 2 foi lançada a 20 de Agosto de 1977. No mês seguinte, a 5 de Setembro de 1977, a Voyager 1 saiu da Terra. A NASA aproveitou Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno, os quatro planetas mais distantes do Sol, estarem em posições óptimas nas suas órbitas para as sondas passarem por eles em tempo-recorde. Nos anos seguintes, as duas sondas passaram por Júpiter e Saturno. Mais tarde, a humanidade teve a oportunidade de ver as primeiras fotografias de sempre de Úrano e Neptuno tiradas pela Voyager 2. Desde que a sonda se afastou de Neptuno para entrar na sua missão interestelar, em 1989, quase dez anos depois da Voyager 1 rumar em direcção à fronteira do Sistema Solar, que mais nenhum aparelho tirou imagens dos dois planetas mais longínquos.
Em 1990, começou oficialmente a missão interestelar. Hoje a Voyager 1 tem alguns instrumentos a funcionar, mas continua a transmitir informação para a Terra, que demora 17 horas para chegar cá. Para testar se existia um fluxo lateral de partículas, a equipa de Decker e Krimigis enviou um comando para a sonda girar em torno de si própria sete vezes, mas não descobriu o movimento de partículas que procurava.
Os resultados da experiência foram uma surpresa para os cientistas. "Não existe nenhuma orientação que nos diga o que é sair do Sistema Solar", explica Krimigis, citado numa notícia da Nature. Há algumas teorias que tentam explicar o que se passa. A sonda pode estar numa antecâmara da heliopausa ou a diminuição da velocidade das partículas pode ser uma consequência de campos magnéticos que se pensa que existam nos confins da heliosfera.Primeiro em Maio, e depois em Julho deste ano, a sonda mediu um pico de raios cósmicos, sugerindo que está a aproximar-se das margens do Sistema Solar. Por isso, Krimigis diz que a Voyager 1 pode atravessar a heliopausa ainda neste ano, mas o espaço pode continuar a surpreender-nos. As baterias alimentadas a energia nuclear da sonda deverão resistir até 2025. Se tudo correr bem, a Voyager 1 terá tempo para sair do Sistema Solar e entrar no ambiente interestelar.
Mesmo quando se desligar de vez, a sonda ainda tem o poder para fazer uma revelação fantástica. A NASA colocou um disco de cobre em cada uma das Voyagers com a informação sobre a humanidade para o caso improvável de um ser inteligente encontrar uma das sondas. Se compreender como o disco funciona, um extraterrestre fica a saber a localização da Terra no Universo e é-lhe revelada a existência da humanidade. Pode compreender a química da dupla hélice de ADN, ouvir a Flauta Mágica, de Mozart, ou o Johnny B. Goode, de Chuck Berry. Pode ver uma mulher a amamentar uma criança e antever o futuro da deriva dos continentes.
O conjunto de informação foi escolhido e organizado por uma equipa liderada por Carl Sagan. Há 55 vozes prontas a cumprimentarem o desconhecido, todas em línguas diferentes. "Paz e felicidade a todos", diz uma mulher em português com sotaque do Brasil. Não se sabe quando é que a Voyager I vai passar a fronteira final do nosso pequeno jardim cósmico, nem se sabe até onde chegará, mas nunca a saudação da humanidade foi tão longe.
Fonte: Público
O Sistema Solar tem o formato de um cometa com uma cauda, que viaja pelo espaço, orbitando em torno do centro da Alfa do Centauro. O Sol está situado no centro da cabeça deste "cometa" e gira lentamente à volta do núcleo da nossa galáxia. Um dos efeitos da sua actividade é a emissão constante de um fluxo de protões e electrões que são expulsos do Sol com muita energia e velocidade, originando o vento solar.
Mas estas partículas vão desacelerando. Em teoria, existe uma fronteira em que as partículas já não empurram o meio intergaláctico, que tem uma constituição de partículas diferente. Mas até onde existe, o vento solar produz no espaço uma atmosfera própria chamada heliosfera que determina as fronteiras do Sistema Solar. À frente do Sol e devido ao movimento da estrela, a espessura da heliosfera é mais pequena. É no limite desta região que a Voyager 1, a sonda da agência espacial norte-americana (NASA), viaja.
Esperava-se, no ano passado, que a máquina ultrapassasse a fronteira do Sistema Solar, depois de as suas medições mostrarem que as velocidades das partículas caíram para zero. Esta observação ia ao encontro do que os cientistas defendiam: a dado momento, depois de viajarem no espaço, as partículas solares deixariam de ter força para empurrar o espaço interestelar e, em vez disso, iniciariam um movimento lateral, tal como acontece quando um fluxo de água embate numa superfície sólida. Desta forma, haveria uma região entre o espaço interestelar e a heliosfera chamado heliopausa.
Mas Robert Decker e Stamatios Krimigis, dois dos autores do artigo da Nature, não mediram esta corrente lateral de partículas. "Concluímos que a Voyager 1 não está neste momento perto da heliopausa, pelo menos na forma como [esta região] foi imaginada", lê-se no artigo da equipa do laboratório de física aplicada da Universidade de Johns Hopkins. O que, em boa medida, significa que, mais de três décadas depois de ter saído da Terra, a sonda continua a surpreender-nos com as suas descobertas.
A Voyager 1 está hoje numa missão interestelar, mas nem sempre foi assim. O objectivo inicial desta sonda e da Voyager 2 - a outra sonda da missão que também continua viva e também se dirige para os confins do Sistema Solar, apesar de não estar tão afastada da Terra -, era o estudo de Júpiter, Saturno e as luas que giram em torno destes planetas.
A Voyager 2 foi lançada a 20 de Agosto de 1977. No mês seguinte, a 5 de Setembro de 1977, a Voyager 1 saiu da Terra. A NASA aproveitou Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno, os quatro planetas mais distantes do Sol, estarem em posições óptimas nas suas órbitas para as sondas passarem por eles em tempo-recorde. Nos anos seguintes, as duas sondas passaram por Júpiter e Saturno. Mais tarde, a humanidade teve a oportunidade de ver as primeiras fotografias de sempre de Úrano e Neptuno tiradas pela Voyager 2. Desde que a sonda se afastou de Neptuno para entrar na sua missão interestelar, em 1989, quase dez anos depois da Voyager 1 rumar em direcção à fronteira do Sistema Solar, que mais nenhum aparelho tirou imagens dos dois planetas mais longínquos.
Em 1990, começou oficialmente a missão interestelar. Hoje a Voyager 1 tem alguns instrumentos a funcionar, mas continua a transmitir informação para a Terra, que demora 17 horas para chegar cá. Para testar se existia um fluxo lateral de partículas, a equipa de Decker e Krimigis enviou um comando para a sonda girar em torno de si própria sete vezes, mas não descobriu o movimento de partículas que procurava.
Os resultados da experiência foram uma surpresa para os cientistas. "Não existe nenhuma orientação que nos diga o que é sair do Sistema Solar", explica Krimigis, citado numa notícia da Nature. Há algumas teorias que tentam explicar o que se passa. A sonda pode estar numa antecâmara da heliopausa ou a diminuição da velocidade das partículas pode ser uma consequência de campos magnéticos que se pensa que existam nos confins da heliosfera.Primeiro em Maio, e depois em Julho deste ano, a sonda mediu um pico de raios cósmicos, sugerindo que está a aproximar-se das margens do Sistema Solar. Por isso, Krimigis diz que a Voyager 1 pode atravessar a heliopausa ainda neste ano, mas o espaço pode continuar a surpreender-nos. As baterias alimentadas a energia nuclear da sonda deverão resistir até 2025. Se tudo correr bem, a Voyager 1 terá tempo para sair do Sistema Solar e entrar no ambiente interestelar.
Mesmo quando se desligar de vez, a sonda ainda tem o poder para fazer uma revelação fantástica. A NASA colocou um disco de cobre em cada uma das Voyagers com a informação sobre a humanidade para o caso improvável de um ser inteligente encontrar uma das sondas. Se compreender como o disco funciona, um extraterrestre fica a saber a localização da Terra no Universo e é-lhe revelada a existência da humanidade. Pode compreender a química da dupla hélice de ADN, ouvir a Flauta Mágica, de Mozart, ou o Johnny B. Goode, de Chuck Berry. Pode ver uma mulher a amamentar uma criança e antever o futuro da deriva dos continentes.
O conjunto de informação foi escolhido e organizado por uma equipa liderada por Carl Sagan. Há 55 vozes prontas a cumprimentarem o desconhecido, todas em línguas diferentes. "Paz e felicidade a todos", diz uma mulher em português com sotaque do Brasil. Não se sabe quando é que a Voyager I vai passar a fronteira final do nosso pequeno jardim cósmico, nem se sabe até onde chegará, mas nunca a saudação da humanidade foi tão longe.
Fonte: Público
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